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3/4 de Mim

3/4 de Mim

Do prazer de ler: "Flor do Deserto"

Li este livro aos 18 anos e nunca mais o esqueci!

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É o mais incrível e emocionante relato de vida da modelo Waris Dirie, actualmente embaixadora especial da ONU na luta pela erradicação da mutilação genital feminina.

 

Ela própria é a narradora da sua incrível história. 

Nascida numa família nómada no deserto da Somália, foi mutilada como muitas outras da sua tribo.

Neste livro levantam-se muitas questões e tocam-se em pontos sensíveis: a liberdade de escolha individual e a liberdade de pôr e dispor do próprio corpo.

 

Este livro tem a sua riqueza na descrição crua, que põe a nu uma cultura e religião tão diferente da nossa realidade.

Foi de forma horrorizada que li que, aos 5 anos de idade, foi sujeita a um ritual há muito estabelecido na Somália (e muitos outros países africanos de ideologia muçulmana), que é o ritual de mutilação genital.

Consiste em cortar  o clítoris ou em remover totalmente o mesmo e os lábios vaginais, cosendo de seguida o "tecido" restante. Fica apenas um orifício de pequenas dimensões por onde a mulher urina e menstrua.

 

E qual o objectivo, perante o ponto de vista deles? Garantir e assegurar a castidade e preservação da virgindade da mulher até ao casamento. Para eles a mulher não tem qualquer direito a prazer sexual. Este acto horrendo elimina o prazer sexual da mulher para sempre.

As mulheres apenas são "abertas" para o marido, na altura do casamento.

 

Entre 70 a 140 milhões de mulheres, às quais foi removido o clítoris, foi removido sem qualquer cuidado médico. São usadas lâminas, facas, pedaços de vidro e até dentadas....

Quando li toda a sequência dos acontecimentos deu-me náuseas e uma imensa vontade de vomitar, tamanho é o acto de crueldade.

Ainda não consigo acreditar que nos tempos em que vivemos tantas crianças, sim porque são apenas crianças, sejam sujeitas a esta mutilação.  E como podem imaginar, muitas acabam por morrer.

 

Um tema delicado que Waris resolveu expor após ter conseguido atravessar o deserto da Somália sozinha com apenas 13 anos. Passou dias sem comida e água e arriscou a sua vida nesta fuga, que acabou por salvá-la.

 

Quando chegou à capital, Mogadíscio, foi para Londres onde trabalhou quase como escrava. Mas sempre sentiu que havia mais à espera dela e que a vida dela ia fazer a diferença. Lutou diariamente pela sua sobrevivência

Enfrentou inúmeras dificuldades, mas teve força e soube sempre aproveitar as oportunidades que surgiram e acabou por se tornar numa modelo de renome internacional e teve a oportunidade de conhecer o mundo.

 

As palavras de  Waris mostram-nos com toda a sinceridade possível a estranheza de encontrar um modo de vida totalmente desconhecido. Um exemplo: o não entender que existiam pessoas brancas e se seria uma doença... A incrível força de Waris para lidar com o imenso choque cultural é um ensinamento de vida para todos.

 

Waris significa Flor do Deserto, em somali.

 

Este livro é uma biografia de uma incrível força, resiliência e determinação de uma mulher corajosa, que tem nome de flor frágil.

 

 

«É difícil saber o que me teria acontecido se não tivesse sido mutilada. Faz parte de mim, não conheço outra realidade(…) Não sabia o que ia acontecer [a total remoção dos órgãos genitais], mas estava contente porque me ia tornar mulher.»